sábado, 28 de novembro de 2009

Os sinais já são visíveis


Pegando um "gancho" no assunto do artigo anterior deste blog, os sinais de inabitabilidade do Planeta Terra, causados pela ação do homem, estão mais visíveis do que nunca. É impossível, a qualquer cético, não percebê-los. Vamos enumerar rapidamente alguns fatos bastante exemplares que foram noticiados durante a última semana, às vésperas que estamos da Conferência do Clima, em Copenhage (Dinamarca), onde algum acordo mundial (extremamente necessário) não sabe-se se vai mesmo ser firmado, devido à resistência de muitos países, que parecem não enxergar a realidade (ou não querem).

Vamos a algumas evidências das mudanças em curso:
- No Recife (Pernambuco, Brasil) a perda de áreas urbanas para o mar já preocupa a população, estimando-se prejuízos imensos aos imóveis construídos junto à orla marítima. Pessoas que vivem há mais tempo na cidade percebem que locais onde antes havia areia, ocupada com quiosques de vendas de água de coco e locais de prática esportiva, hoje são ocupados pelo mar.

- Da mesma forma, no litoral paulista também percebe-se a redução de diversas praias ao longo dos anos (sem retorno à condição anterior, comprovando que não é um fator "cíclico", como muitos dizem). A praia do Gonzaguinha, em São Vicente, está quase desaparecendo. Diversas praias de Ubatuba também sofrem redução bastante significativa. Obviamente que a construção desenfreada de edifícios, portos, estradas,etc. junto à faixa litorânea brasileira altera significativamente a dinâmica da região. Isso aliado ao aumento global do nível dos mares já gera um prejuízo estimado em R$ 207,5 bilhões aos proprietários de imóveis em toda a costa de nosso país.

- Na Suíça um de seus principais atrativos turísticos, que são as estações de esqui nos Alpes, estão ameaçados pela redução gradativa da neve, ano a ano. Estima-se que o país poderá perder US$ 1,6 bilhão por ano se esquiadores passarem a deixar de visitar as montanhas. Até mesmo olimpíadas de inverno estão sendo ameaçadas de continuar sendo realizadas (estações de esqui em outros países, como Canadá e Estados Unidos, sofrem o mesmo efeito). O sinal real disso é que bancos estão negando empréstimos a estações de esqui em pontos mais baixos, mais vulneráveis à falta de neve, assim como patrocinadores de jogos de inverno estão repensando se continuam a investir neles. Será que nem quando o "bolso" das empresas começa a ser afetado pelo aquecimento global, os países não vão pensar em fazer algo para tentar reverter esta tendência?

- Na cidade de Iqaluit, em pleno ártico canadense, habitat há séculos dos povos esquimós da etnia inuíte (famosos por sobrevivência no gelo), o aquecimento global não é um problema para o "futuro da humanidade", segundo conclui a prefeita Elisapee Sheutiapik. No verão do ano passado a temperatura bateu em 26 graus célsius, em pleno ártico, algo nunca visto por lá! Ao mesmo tempo que o degelo libera áreas de terra, que antes não podiam ser habitadas, o aumento do volume das águas inunda diversas áreas e chegou até a derrubar uma ponte. E os lagos congelados por onde podia-se caminhar, antes tão conhecidos dos moradores, não se sabe mais quando nem por quanto tempo estarão em condições de serem atravessados a pé...

- A ilha de Kiribati, no Oceano Pacífico, está ameaçadíssima de desaparecer e o presidente Anote Tong já guarda recursos do país para uma possível realocação de seus 100.000 habitantes em algum outro lugar do planeta, pois cada vez mais a população é ameaçada por tempestades nunca antes vistas e pela invasão das águas do mar sobre suas terras, cuja altitude não ultrapassa os 5 metros sobre o nível do mar. E este é apenas um exemplo, dentre várias ilhas do Pacífico que encontram-se sob a mesma ameaça - detalhe é que são países que emitem pouquíssimo carbono em relação à média mundial, mas são os mais ameaçados.

-A Holanda já investe em casas anfíbias, construídas sobre a água e cuja altura pode variar através de elevadores hidráulicos, pois o país - em grande parte situado abaixo do nível do mar - já não vê os diques de contenção como suficientes. Vislumbra-se a possibilidade de transferir grande parte de sua população para dentro da própria água.

- Na região da Patagônia, no sul da Argentina, tempestades de areia inviabilizam fazendas inteiras. A mudança climática tornou a região, antes fria e seca, um pouco mais quente e úmida após os anos 1970, o que fez com que muitos fazendeiros instalassem-se na região, desmatando as florestas existentes para substituí-las por pastagens e plantações. Depois disso, o nível pluviométrico veio a baixar novamente e a ausência de florestas não conteve a areia, que começou a cair sobre as outrora verdes pastagens e plantações. Sinais de que o desrespeito à natureza traz suas conseqüências.

- Na região do Caribe e proximidades, incluindo Cuba e também o sul dos Estados Unidos o volume de tempestades, que incluem tornados, aumenta sem parar. Entre 1980 e 1990 houve uma média de 10 tempestades tropicais por ano na região. Entre 1998 e 2007 a média passou para 15 por ano, sendo que 8 delas são furacões. Se nem a riquíssima nação norte-americana ainda não teve tempo de adaptar-se a um número tão grande de catástrofes ambientais (vide o Katrina, em New Orleans), imaginem a paupérrima Cuba, que hoje até aceita ajuda financeira e tecnológica de entidades provindas de seu grande "inimigo imperialista", para reparar os danos sem fim que as desordens climáticas causam à população local.

- O sul do Brasil já possui áreas quase inviabilizadas para a moradia em grande parte do ano. Só no Rio Grande do Sul em dois meses e meio, já foram 12 temporais fortes, considerados desastres naturais pela Defesa Civil do Estado. Nos últimos 15 dias, 66 cidades decretaram situação de emergência. E 15,8 mil casas foram danificadas. Quase 5 mil pessoas estão sem ter onde morar e mais de 20 mil pessoas tiveram que deixar as casas em todo o estado.Importante notar que várias destas regiões sofreram com secas nunca vistas há muito pouco tempo. São extremos climáticos que não existiam. Não precisamos nem mencionar Santa Catarina, onde um desastre climático destruiu boa parte do Vale do Itajaí e adjacências há um ano atrás, sendo que este ano as chuvas causaram estragos novamente na mesma região. No oeste e norte do Paraná também são vistos tornados a praticamente todas as semanas, devastando diversas cidades. Estas regiões também sofreram seca recentemente. E importante notar que, nos últimos 50 a 60 anos, estas áreas tiveram suas florestas dizimadas em nome do "desenvolvimento" e da abertura das "fronteiras agrícolas" (sempre este mesmo discurso). Se uma política de preservação tivesse sido implementada, talvez não tivéssemos ventos e inundações tão fortes. A água e o ar deslocam-se com muito mais rapidez sem as barreiras naturais, são leis da física.

- As secas Amazônicas, que assustaram o mundo no ano de 2005, voltaram este ano, contradizendo o mito de que as águas da região são 'infinitas' (ilusão que leva à construção de imensas hidrelétricas por lá) e confirmando o perigo de "savanização" da floresta; que pode ocorrer se as mudanças climáticas e o desmatamento se intensificarem ainda mais;

- O derretimento das geleiras nos países andinos, como Peru, Bolívia, Chile, Argentina; já ameaça o abastecimento de água em várias cidades à beira dos Andes (em muitos locais já não há quase mais gelo algum).

Existem muitos outros casos, além dos citados acima que poderíamos listar aqui. E é importante ressaltar que as emissões de gases estufa aumentaram 62% apenas no Brasil entre 1990 e 2005. A proposta do Brasil em Copenhage não trará obrigatoriedade de corte de emissões, apenas "intenções". Da mesma forma os Estados Unidos quer agir, alegando não saber se o congresso aprovará as reduções. Assim também pensam paises como Australia e Canadá (que nem assinaram Kyoto, em 2007). A China (o maior emissor atual), que ia até boicotar a reunião, agora propõe medidas de eficiência energética (e eles têm condições). Os países pobres alegam que só os ricos precisam reduzir (esquecendo-se que nenhum acordo é possível sem a anuência dos "pobres", pois mais da metade das emissões do Planeta provém deles!). Enfim, quase todos ficam na superficialidade, enquanto os efeitos do aquecimento estão aí visíveis para quem quiser e para quem não quiser enxergá-los.

E olha que mudanças na matriz energética não são impossíveis, pois a tecnologia está aí, e nem tão caras, visto que com a escala reduziriam-se os custos! Só os desertos dos Estados Unidos e da China são suficientes para gerar energia solar e eólica para ambos os países mais poluidores! Se a Alemanha e a Dinamarca, por exemplo, que são países muito menores e com menos sol, estão conseguindo mudar suas matrizes para energias limpas, porque países maiores não conseguem? O Brasil, então, com toda a abundância de vento e sol, quer investir em hidrelétricas que sumbergem florestas (as quais absorvem carbono) e termoelétricas ultrapassadas e poluentes! Ou seja, tudo na contra-mão!

Sabe-se que quaisquer ações que sejam tomadas não terão impactos necessários na diminuição das mudanças climáticas. O que vivemos hoje é conseqüência, muitas vezes, da poluição ocorrida há mais de 50 anos atrás. Portanto estamos atrasados em começar a tomar providências. O Mecanismo de Desenvolvimento Limpo é um caminho, muita coisa já começou a ser feita, mas é preciso ter continuidade. Esperamos que Copenhage nos mostre esta continuidade.


Fonte das Informações: Jornal O Estado de São Paulo, edições entre 25 e 27 de Novembro de 2009

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Gabriel Bertran

sábado, 21 de novembro de 2009

A Terra está se tornando inabitável?


Sabe-se que, em termos geológicos, o ser humano está há muito pouco tempo habitando o Planeta Terra. Não vou entrar em detalhes científicos, mas existem estudos comprovando que, proporcionalmente, se a Terra existisse há um ano, nós teríamos chegado aqui mais ou menos às 23h45 do dia 31 de dezembro, ou seja, nos últimos 15 minutos. Os dados são aproximados, mas servem para ilustrar que este pequeno grão de areia solto no espaço, que é nosso planeta, não precisa de nós.

A pergunta é: esta esfera de pedra onde por acaso nós nos instalamos estará se tornando inabitável para nós mesmos, em função das mudanças que nós, em tão pouco tempo, causamos nela? O mais incrível é que grande parte desta destruição deu-se nos últimos 100 anos; apesar de estimar-se que o homem surgiu aqui há mais de 2 milhões de anos. Ou seja, foi um impacto muito rápido o que se deu desde a revolução industrial.

Voltando à pergunta-título deste artigo, ela poderia justificar-se por diversas evidências desta inabitabilidade que vemos pelo planeta afora. Não precisamos ir muito longe. Aqui mesmo, nas regiões Sul e Sudeste do Brasil as tempestades estão tornando-se tão freqüentes que parecem inviabilizar a vida em determinadas cidades e em suas cercanias. Veja-se quantas localidades do Rio Grande do Sul está debaixo d´água semanalmente. No Oeste e Norte do Paraná as tempestades com rajadas de vento (praticamente semanais também) destróem casas, árvores, postes e tudo o que tem pela frente. Em São Paulo as chuvas acima de média constantemente inviabilizam regiões inteiras da metrópole, que ficam embaixo da água. Diversas vezes comentamos aqui a inviabilidade do Vale do Itajaí, em Santa Catarina, que em vista das condições geográficas e ampla destruição florestal, submerge a qualquer chuva, como vimos em novembro de 2008 e na metade de 2009 também. E não é preciso nem mencionar diversas ilhas do Pacífico que constantemente submergem ou mesmo o furacão Katrina, que há poucos anos atrás destruiu New Orleans, nos Estados Unidos.

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Gabriel Bertran

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

O Apagão Ambiental


Nesta semana o Brasil sofreu um "apagão" energético, tendo o corte de energia atingido cerca de 18 estados da federação, por volta das 22h da terça-feira (dia 10/11).

Não iremos nos ater aos detalhes do ocorrido, pois a imprensa já nos forneceu notícias suficientes sobre o assunto nos últimos dias.

Nem mesmo podemos atribuir, ainda, culpados pelo desastre. Seria muita irresponsabilidade de nossa parte. Da mesma forma, foi de grande irresponsabilidade o governo federal querer "encerrar" o assunto menos de 48 horas após tamanho transtorno ter acontecido. Bem aos moldes de governos ditatoriais como o da antiga União Soviética, o discurso oficial quis apenas apaziguar os fatos, alegando "estar tudo bem" e atribuindo causas climáticas à queda de energia. Tais discursos vergonhosos foram perpetrados pelo ministro Edison Lobão, das Minas e Energia e pela ministra Dilma Rousseff, da Casa Civil. É visível a ocultação e a negação de fatos, como por exemplo a tentativa de calr o respeitado INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), que em suas investigações meteorológicas não detectou raios no local por onde passa a rede de alta tensão de Furnas em Itaberá (SP), onde alega-se ter ocorrido a causa do blecaute. Leiam mais em http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20091112/not_imp465216,0.php

Só gostaria de saber por que esta pressa em afirmar que a culpa são dos raios (sem ao menos investigarem), assim como a pressa em "encerrar o assunto"? Isso sem contar a agressividade da ministra com os jornalistas, tentando se defender e antecipando-se que o "apagão da época do pres.Fernando Henrique foi muito pior". A discussão deveria ser técnica, e não política.

Não vou me estender nas causas do apagão, primeiramente por minha formação não ser em engenharia elétrica nem mesmo áreas correlatas. Segundo porque as investigações nem bem começaram. O que eu quero, como cidadão brasileiro (e acho que boa parte dos leitores aqui também) é que os fatos sejam esclarecidos e providências tomadas, pois nada pode pagar o transtorno que milhões de brasileiros passaram naquela noite. Quero que os dirigentes destas estatais - a maioria apadrinhados do PT e do PMDB e que nada entendem sobre o sistema elétrico - sejam honestos uma vez na vida e expliquem-se. Sei que isto é pedir muito a este (des)governo.

E o que acontece, como sempre, em nosso país, é que o maior prejudicado sempre é o meio-ambiente e, por conseguinte, nós, cidadãos, pois dependemos da natureza equilibrada - por mais que ela não esteja. Estranhamente, o novo "apagão" causou, imediatamente, o apressamento da licença de instalação da Usina Hidrelétrica de Santo Antônio, em plena Amazônia, uma das obras faraônicas e destruidoras ambientais que justamente o Brasil não precisa! Foi bastante estranho tal anúncio e quem perde, como já mencionado, é a natureza, a biodiversidade, nossos rios, nossas florestas... Por mais que aleguem que as novas usinas causam impactos "mínimos" no meio-ambiente, as exigências nunca são cumpridas e obras de tal magnitude levam uma quantidade imensa de imigrantes para o meio da floresta que, após o encerramento delas, ficarão desempregados e depredarão tudo o que estiver a sua volta por falta de opção, pois como sempre, nada é amplamente planejado no Brasil. Tudo é imediatista. Várias experiências com grandes obras como estas nos mostram o cenário de destruição que deixam.

E por falar em imediatismo, ...

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Gabriel Bertran

Matéria no site da Itambé:O sustentável deve ser acessível

O sustentável deve ser acessível

Seminário ECOARQ detecta que o Brasil tem leis ambientais avançadas, mas que carecem de incentivos para que a cadeia produtiva da construção civil as absorva

O seminário ECOARQ destacou as construções que surgem no Brasil com a certificação LEED

O seminário ECOARQ destacou as construções que surgem no Brasil com a certificação LEED

Curitiba sediou no começo de outubro o 2.º Seminário Brasileiro sobre Arquitetura Sustentável (ECOARQ) . O encontro debateu a união de esforços entre arquitetura, urbanismo, engenharia civil, paisagismo e design de materiais e interiores para colaborar com a minimização do impacto ambiental.

Uma das conclusões é de que o Brasil dispõe de leis ambientais modernas, mas que carecem de incentivos para entrarem no dia a dia da cadeia produtiva da construção civil. É o que revela o arquiteto Gabriel Bertran, um dos organizados do ECOARQ, que sintetiza na entrevista abaixo o que foi debatido no seminário. Confira:

Já há um consenso entre arquitetura, urbanismo, engenharia civil e paisagismo sobre os impactos das obras sobre o meio ambiente? Caso sim, quais medidas estão sendo tomadas?
Creio ainda não haver este consenso. O que existe são ações isoladas em cada uma das áreas, as quais de fato poderiam ser integradas. As medidas que estão sendo tomadas ainda são, em sua maioria, de caráter individual, como, por exemplo, uma minoria de arquitetos e construtoras conscientes construindo de forma sustentável. Há também algumas indústrias que incorporam sustentabilidade em parte de seus processos de produção e também o voluntarismo de alguns empreendimentos que acabam recebendo certificados de sustentabilidade. Quanto ao poder público, há leis ambientais avançadíssimas, mas faltam serem aplicadas de forma mais ampla. Elas carecem de incentivos, como corte de impostos, para que toda a cadeia produtiva utilize mais soluções sustentáveis e se crie realmente uma mudança no mercado para estes produtos e processos a serem usados.

Quais são, hoje, os principais casos de sucesso na construção civil sustentável, seja em Curitiba, no Paraná, no Brasil ou fora dele?
Em Curitiba, está em fase de conclusão o primeiro edifício com certificação LEED (do inglês Leadership in Energy and Environmental Design – Liderança em Design de Energia e Meio Ambiente) no Paraná. A certificação é concedida pelo Green Building Council (GBC Brasil), uma organização mundial sem fins lucrativos que certifica edificações que cumpram determinados requisitos sustentáveis. O edifício é o Curitiba Office Park, no Jardim Botânico. No caso do Brasil, existem cerca de 140 empreendimentos certificados ou em fase de certificação pelo GBC Brasil – a maioria deles em São Paulo e, geralmente, grandes empreendimentos comerciais. Mas isto já mostra uma tendência, pois a sustentabilidade, além de valorizar mais estes empreendimentos, gera economia de energia, água e manutenção em sua operação. Em relação aos empreendimentos residenciais, existem inúmeras ações isoladas, inclusive algumas delas provêm dos anos 70 e 80. Porém, não são catalogadas, a não ser em revistas especializadas. No mundo, mais de 45 países já incorporam a sustentabilidade em construções, sendo os principais França, Alemanha, Espanha, Estados Unidos, Brasil, China, Índia e Japão. Já há mais de mil edificações certificadas como sustentáveis no planeta. Além do selo LEED, existe o selo HQE francês, bem como certificações específicas da Alemanha, Inglaterra e Austrália.

Gabriel Bertrand: “O sustentável deve ser acessível. Assim, a sustentabilidade torna-se mais conhecida.”

Gabriel Bertran

Entre as palestras ministradas no seminário ECOARQ, qual agregou mais riqueza ao debate?
Todas foram de uma riqueza conceitual imensa, inclusive com temas complementares uma a outra. Eu destacaria a palestra dos arquitetos Sérgio Prado e Márcia Macul, os quais propuseram um sistema integrado de gestão de resíduos, chamado “Lixo Zero, Arquitetura Sustentável, Energia Renovável”. Trata-se de um projeto totalmente viável, já com materiais de construção super-resistentes, desenvolvidos a partir de todo tipo de resíduos urbanos, industriais e de construção. Além da inclusão social, tal projeto resolve o problema da poluição urbana pelos rejeitos que a sociedade dispõe. Envolve arquitetura, meio-ambiente, energia e um sistema de gestão para tudo isso. Destacaria também a palestra e o curso do doutor Eloy Casagrande, professor da UTFPR, em que ele demonstrou com exemplos práticos como podemos utilizar inúmeros materiais de construção ecológicos sem gastar muito. Envolve tanto produtos industrializados como também reaproveitados, feitos a partir de materiais que são muitas vezes rejeitados.

Como os profissionais da área de construção civil vêm se preocupando com as questões bioclimáticas e ambientais?
Neste sentido, eu destacaria a palestra do arquiteto Tomaz Lotufo como exemplo. Ele pratica em seus projetos, no interior de São Paulo, arquiteturas de baixo impacto, aproveitando os recursos do local, como o barro e os entulhos, por exemplo, para construir casas de excelente qualidade arquitetônica e confortáveis ambientalmente. Foram apresentadas, também, soluções de saneamento natural (tratamento biológico de esgoto), bem como a utilização de tijolos solo-cimento, que não são queimados e, portanto, emitem baixo carbono. Enfim, são soluções simples que trazem qualidade à construção civil e preservam os recursos naturais. Além disso, podem ser executadas por qualquer um. Isto é o que chamaríamos de arquitetura bioclimática. Por enquanto, temos poucos exemplos como este no Brasil, apesar de tais tecnologias estarem presentes, muitas vezes, há séculos em nosso planeta. A questão é divulgá-las melhor, para serem mais utilizadas.

Daria para dizer que os profissionais se preocupam mais com esta questão do que o setor das construtoras?
Tais dados ainda são muito difíceis de serem levantados. Eu diria que as construtoras têm mais acesso a recursos tecnológicos avançados em termos de sustentabilidade e às certificações também, em vista da escala em que trabalham. Isso torna seus empreendimentos “sustentáveis” mais visíveis, porém temos que tomar muito cuidado com maquiagens que nos são apresentadas. Há alguns que se dizem sustentáveis, mas no fundo não são. Já os arquitetos que trabalham com isto estão, aos poucos, aumentando. Muitas vezes os profissionais esbarram no desconhecimento que seus clientes têm do assunto. Até pela falta de opções (devido à falta de incentivos), os produtos sustentáveis são mais difíceis de serem encontrados e por “comodismo” compra-se o trivial. Mas o consumidor tem-se tornado exigente em termos de qualidade e espera-se que se torne, também, na questão ambiental. Para dar um exemplo, comprar uma madeira da Amazônia incentiva o desmatamento e as pessoas precisam estar conscientes disso. Os arquitetos, como formadores de opinião, têm um papel importante neste convencimento.

A palestra sobre Redução dos Gases de Efeito Estufa nas Construções Civis apontou quais soluções para se atingir isso na prática?
Na prática o que esta palestra apontou foi justamente a análise do que especificar em termos de materiais para a construção civil, procurando escolher os que tenham emitido o menor volume de carbono possível, desde a extração de suas matérias primas, passando pela fabricação, transporte, até a obra e também emissões durante sua utilização. É necessário que se analisem todos estes fatores e também o ciclo de vida do material e da edificação. Quanto mais tempo pudermos utilizar a edificação melhor para o meio-ambiente, mostrando que o sustentável também precisa ser durável. Os fatores de gastos energéticos também devem ser levados em conta. Como exemplos, podemos citar as madeiras amazônicas, que causam aumento expressivo das emissões tanto com a supressão das florestas (que armazenam carbono) quanto com o transporte dos materiais do norte ao sul/sudeste do Brasil, emitindo carbono com a queima do diesel. É melhor optar por madeiras plantadas em regiões próximas ao local da obra. Outro exemplo são as tintas, que muitas vezes utilizam produtos químicos altamente poluentes, que emitem CO2 tanto na fabricação quanto após a aplicação nas paredes. São apenas alguns exemplos, dentre inúmeros existentes.

A respeito de materiais e técnicas construtivas, o Brasil está bem posicionado ou ainda precisa rever conceitos?
Ainda precisa rever muitos conceitos. O brasileiro é comodista, pensando no curto prazo, e isso se reflete no mercado. Compra-se o convencional, até por falta de opção. É necessário pensar em termos de custo-benefício: uma solução sustentável vai gerar economia ao longo da utilização do imóvel. Além do mais, o poder público precisa incentivar o desenvolvimento e a fabricação destas soluções, via redução de impostos e outras políticas. O sustentável deve ser acessível. Assim, a sustentabilidade torna-se mais conhecida. E quanto mais for incorporada ao dia-a-dia de todos, melhor para o meio-ambiente. Diversos países já incentivam tais soluções.

Uma política sustentável na área da construção civil faria o Brasil reduzir quanto na emissão de carbono? Já há números sobre isso?
Não há, ainda, números de quanto se reduziria. Mas há números aproximados sobre o impacto da construção civil no meio-ambiente, segundo dados da Fundação Getúlio Vargas e da União Nacional da Construção. São eles:
- 40% dos recursos naturais extraídos são destinados a indústria da construção civil
- 50% dos resíduos sólidos urbanos são provenientes de construções e demolições
- 50% do consumo de energia elétrica é destinado para operação das edificações (desde a construção até a utilização).
Por aí vemos que qualquer ação que reduza tais impactos será importantíssima. Reduzindo-se os resíduos, a extração dos recursos naturais e o consumo de energia, com certeza ajudará muito na redução do CO2 no planeta.

Entrevistado: gabrielbertran@ecolearning.com.br


Vogg Branded Content – Jornalista responsável Altair Santos MTB 2330

Esse post foi publicado de quarta-feira, 4 de novembro de 2009 às 14:45, e arquivado em Construção Sustentável. Você pode acompanhar os comentários desse post através do feed RSS 2.0. Você pode comentar ou mandar um trackback do seu site pra cá.


FONTE DESTA PUBLICAÇÃO:
http://www.cimentoitambe.com.br/massa-cinzenta/o-sustentavel-deve-ser-acessivel/?PHPSESSID=d096171f21226d397e70b894e6be9f83