sexta-feira, 28 de novembro de 2008

SANTA CATARINA:TRAGÉDIA ANUNCIADA?

Nos últimos dias nós temos acompanhado pelas televisões e jornais a ampla tragédia ambiental que ocorre na região do Vale do Itajaí, em Santa Catarina. Nem precisamos mencionar os mais de 70.000 desalojados e os mais de 100 mortos com as enchentes e desabamentos que têm ocorrido nas cidades da região. Nem mesmo podemos deixar de nos solidarizar com todas estas vítimas. Vítimas tanto das chuvas quanto da falta de planejamento urbano por parte das autoridades, ao longo de décadas.

Seria esta uma tragédia anunciada? Acredita-se que sim, e não é de hoje. É claro que há o agravante do aquecimento global, que desequilibra o clima em todo o planeta. Já afirma-se que as chuvas deste ano na região de Blumenau estão em um volume recorde, acima de todas as medições anteriores.

Sabe-se também que todo o Vale do Itajaí está muito próximo ao nível do mar, e aquela região, em épocas remotas, já foi toda ocupada pelo mar, ficando, ao longo de milênios, o rio Itajaí-Açú como principal curso d´água. Portanto, o local que a água tenta ocupar já, digamos assim, foi dela. E todo rio possui uma área inundável a sua volta, conforme o volume de chuvas. O mesmo princípio pode ser aplicado, por exemplo, ao rio Tietê, em São Paulo (e foram fazer grandes aveninas justamente na área de inundação natural em volta do rio).

O Vale do Itajaí foi um dos principais vetores de ocupação de Santa Catarina. E ao longo de seu curso estabeleceram-se prósperas cidades, fundadas principalmente por alemães. Mas, a dinâmica das águas dali já era conhecida de habitantes bem anteriores aos alemães, que chegaram somente no século XIX. Outro dia, conversando com um professor da faculdade de arquitetura da UFSC, por coincidência especializado na história do Vale do Itajaí, ele contou que, ao chegar na região nos anos 1840, o Dr. Hermann Bruno Otto Blumenau, ele fora alertado por um caboclo que residia no local que a área onde hoje está erguida a cidade que leva seu nome era extremamente alagável. O caboclo até sugeriu um outro local próximo, mas o Dr. Blumenau não quis ouvi-lo... nada contra a engenharia alemã, que é das mais avançadas do mundo. Inclusive hoje em dia a Alemanha refloresta as margens de seus rios, devolvendo a eles sua dinâmica natural. Mas, no século XIX, a natureza ainda era "inimiga" do homem, tinha que ser domada a todo custo e achava-se que era fonte inesgotável de recursos. Hoje vemos que estes recursos estão no fim, precisamos já de três planetas terra para mantermos nosso padrão de consumo atual.

Este pensamento da natureza como inimiga faz com que construamos as cidades sem respeitá-las. No Vale do Itajaí, o aumento populacional agravou e muito a tragédia. Na grande enchente de 1984 (que já foi superada pela deste ano) não houve tantos deslizamentos como nesta, o que denota muito mais gente vivendo em encostas ou cortando-as para abrir estradas ou mesmo desmatando suas florestas naturais, que seguram a terra com as raízes. O que se vê nas imagens são morros sem a mínima sustentação, sendo levados como massa de bolo ainda não assado, e com isso empurrando casas, vidas e tudo o mais que está sobre ou abaixo deles.

É claro que temos que ajudar todas estas famílias. Muitas nem tinha conhecimentos técnicos ou ambientais para construírem nestes locais. Aí perguntamos, como sempre, onde estavam as autoridades nestas horas? Se temos leis ambientais rígidas , por quê não são cumpridas? Claro, sempre prevalece o clientelismo, o populismo de prefeitos e vereadores que querem se aproveitar da situação, "aprovando um desmatamentozinho ali e outra obrinha ali" ou mesmo fazendo vista grossa para estas aberrações. Sem apoio, as polícias ambientais e outras autoridades que poderiam fiscalizar nada fazem, e os problemas só vão aumentando até estourarem da forma que estouraram nesta semana.

Isto não acontece apenas em Santa Catarina não. Por todo o Brasil a corrupção e o descaso acabam com nossa natureza, com nossas belezas. Basta ver as imensas favelas de São Paulo e Rio de Janeiro, verdadeiras metrópoles caóticas dentro das metrópoles, avançando sobre a mata-atlântica, sobre os mananciais de água (como é o caso da Represa Billings, em SP) e sem que ninguém impeça. Pelo contrário, pode contar que sempre tem algum "político local" incentivando invasões em áreas de preservação, em troca de votos. Nas últimas eleições cheguei até ouvir promessas de uma candidata a prefeita de Curitiba (que, ainda bem, não ganhou) prometendo "afrouxar as leis ambientais" para regularizar invasões! Ou seja, legaliza-se o que está errado! Se estas áreas são de preservação (e deveriam haver muitas outras) é porque estudos foram feitos para que assim sejam consideradas! É por beneficiar toda a população que precisamos de áreas preservadas! E, em nome de um populismo barato, sacrifica-se todos por poucos!

Voltando a Santa Catarina, sabe-se que, segundo o Atlas da Mata Atlância, emitido pela ONG SOS Mata Atlântica, este foi o estado que mais desmatou este bioma nos últimos anos. E um bioma do qual restam menos de 7%, que deveria ser incontestavelmente preservado, por conter a mais alta biodiversidade do planeta. E tudo em nome de um suposto "desenvolvimento". A economia do estado cresce, mais indústrias se instalam, a agricultura se expande, o porto importa e exporta de tudo, libera-se para os turistas construírem suas casas de praia por toda parte, etc. Sem limites. Tudo isso a custo de quê? As imagens atuais dizem tudo. Será que esta mata atlântica já não está fazendo falta? É preciso repensar o tal "crescimento infinito".

6 comentários:

Dando Pitacos disse...

Acho que seu raciocínio está correto, GABRIEL!

Faço minhas as suas palavras prá também dizer que "isto não acontece apenas em Santa Catarina não. Por todo o Brasil a corrupção e o descaso acabam com nossa natureza, com nossas belezas. Basta ver as imensas favelas de São Paulo e Rio de Janeiro, verdadeiras metrópoles caóticas dentro das metrópoles, avançando sobre a mata-atlântica, sobre os mananciais de água (como é o caso da Represa Billings, em SP) e sem que ninguém impeça".

É muito fácil, depois da desgraça, liberar verbas para "a reconstrução" do que pode ser destruído novamente, se as autoridades não atentarem para os detalhes técnico-ambientais que a questão exige. Por isso acho que seu texto está perfeito!

Um grande abraço...

Dando Pitacos disse...

Apenas para ilustrar meu comentário anterior:

Em 2008 o Governo Federal usou apenas 12% (doze por cento) da verba prevista no orçamento para obras de prevenção contra tragédias como a ocorrida em SANTA CATARINA e mais precisamente no VALE DO ITAJAÍ.
Confira tudo no vídeo:
http://jornalnacional.globo.com/Telejornais/JN/0,,MUL885495-10406,00-GOVERNO+REDUZ+VERBAS+PARA+EVITAR+DESASTRES.html
Fonte: Jornal Nacional (01/12/2008)

Fusca disse...

Carlos Roberto analisou muito bem e documentou o que vemos em todos os projetos de saneamento, segurança, infra-estrutura, projetos sociais, e tudo o que importa para tirar o povo da miséria: o desgoverno anuncia projetos imensos, destina parcela ínfima dos valores anunciados, e no final aplica apenas uma fração ínfima desse valor aos projetos. Por causa desse descaso é que o Brasil caiu para os níveis mais baixos da América e do mundo no IDH, na educação e na distribuição de renda desde 2003 (somente de 2003 a 2005, o Brasil caiu 7 posições no 'ranking' mundial do IDH). De 2004 a 2007, os 5% mais pobres ficaram mais pobres ainda (com parcela menor da renda nacional) apesar das bolsas-votos.

ARQ. GABRIEL ENGRACIA disse...

Caros amigos,
O pior de tudo é que, após esta tragédia ter deixado NA CARA de todo mundo que a destruição do meio-ambiente tem sim suas conseqüências para todos nós, o governo de Santa Catarina prepara um pacote para "afrouxar as leis ambientais"!!! Sim, isto parece piada, mas não é, tenho lido em jornais e sites da internet. Querem diminuir parques estaduais, diminuir a exigência de mata ciliar (tão importante para a manutenção dos rios), permissão para substituir (mais) matas nativas por eucaliptos e muitos outros absurdos! Não é possível, eles só podem estar tirando sarro da nossa cara! É visível que onde mais inundou foi em volta de rios com áreas desmatadas, onde mais desbarrancaram morros foi justamente em locais com supressão da mata-atlântica, para plantio de bananas ou eucaliptos ou simplesmente para cortar o morro, acabando com sua sustentação! Tudo na contra-mão ; será que o governo catarinense quer condenar toda sua população à morte?
Isso sem falar no aumento de licensas para especulação imobiliária,que já é fortíssima no litoral de SC. Ou seja, tudo na contra-mão, tudo contra a natureza.
Quando precisamos,cada vez mais, de "TOLERÂNCIA ZERO" com os desmatadores,mais os (des)governos querem favorecê-los.
E isso porque o Estado de Santa Catarina é o que mais desmatou a quase extinta mata-atlântica nos últimos anos! Tudo em nome de um "desenvolvimento" que leva a isso aí que vimos nas TVs: desabrigados, refugiados, mortos, feridos, etc. É isso que os governos e os especuladores imobiliários querem???

Vision Club a maior empresa de marketing em rede do Brasil. disse...

Esse é o nosso Brasil...
pAÍS governado pra elite...
seu pensamento esta corretissmo amigo,as autoridades estão totalmente despreparadas pra esse tipo de ocasião(tragédia)!
manipulam a informaçao através da televisão,e só fazem da vida publica oq fazem na privada um monte de coisa que não serve pra nada...
Só com a Força de DEUS é que vamos mudar...desculpa se falei algo de errado mais vi que aki é um espaço democrático então vim expressar meus sentimentos!
não vemos "ORDEM NEM PROGRESSO"" nossa bandeira é uma piada,a sociedade ta ferrada com a falta de saneamento,agua de qualidade e esgoto.Excluindo o povo tudo nesse Brasil gera desgosto,entendam minha critica o motivo dessa pauta é a vontade politica,e se pelo menos destribuissem renda vou até manda um salve ao Ministro da fazenda:de uma ajuda a essas pessoas que nao tem o que comer nem onde dormir..E não banqueiros trambiqueiros e caloteiros,que andam de avião ou então de carro 0 POR AI..!
Já que todo mundo termina no cemitério é preciso avaliar melhor esses critérios deixar de fazer leis que só favorem vcs.Talvez valorizando o cidadão ao invés do cifrão!pq quem tem dinheiro esta com o seu burro na sombra ,pq na sombra é que existe muito burro infelizmente em pouca sombra a criminalidade no Brasil vem aumentando e só ta faltando fazer um levantamento ou uma planilha estatística...excluindo a policia onde é que tem mais ladrão me diga nas favelas ou na politica?

ARQ. GABRIEL ENGRACIA disse...

É incrível, mesmo depois das tragédias de Novembro do ano passado, os catarinenses não aprenderam: querem continuar desmatando a mata-atlântica e agora os deputados estaduais praticamente oficializaram isso: ontem (31/03/09) foi aprovado o Projeto de Lei nº 238/08, que, dentre diversos absurdos, diminui a área de proteção permanente nas beiras de rios de 30 para 10 metros, libera plantações em topos de morro, dentre diversas outras permissões para crimes ambientais ou para legalizar os crimes já cometidos.

Agora foi escarrado na cara de todo mundo que a infinidade de deslizamentos e enchentes do ano passado se deveu única e exclusivamente à ocupação destas áreas. O Estado de SC foi o que mais desmatou a Mata-Atlântica (bioma em maior perigo no Brasil) entre 2000 e 2007. Agora como podem aprovar uma lei destas, ainda com o apoio da maioria dos agricultores do estado, provavelmente cooptados por políticos populistas?

Escrevam o que eu digo: agricultor que desmatar, vai colher mais lama daqui para frente. Esta lei é um verdadeiro "tiro no pé". Depois não adianta pedirem ajuda ao Brasil inteiro se os catarinenses não fazem a "lição de casa". É duro dizer isto, mas é a mais pura verdade!

Ficamos de luto mais uma vez pela Mata-Atlântica.. Protestemos contra a Assembléia Catarinense!!