terça-feira, 29 de março de 2011

Tragédias recentes esquecidas?




Caros amigos,
Desculpem minha ausência deste blog por tanto tempo. Tenho me dedicado bastante a estudos na área de meio ambiente o que, por incrível que pareça, tem me deixado sem tempo de escrever aqui! Mas pretendo voltar a ser mais constante no blog.

Não poderia deixar de comentar sobre as recentes tragédias ambientais que ocorreram no Brasil. Recentes, porém já incrivelmente esquecidas, após o carnaval! Eu nem comentarei sobre o terremoto e tsunami no Japão. Temos que nos solidarizar sim com as vítimas da tragédia no país asiático. Mesmo esta tendo sido causada por questões geológicas, naturais e, portanto, até onde sabemos, sem "autoria" humana, deixou um rastro de destruição e desnudou o perigo das usinas nucleares, estas sim feitas pelo homem e que devem ser repensadas.

Voltando ao nosso país, em fevereiro a região serrana do Estado do Rio de Janeiro foi assolada por chuvas intensas, fora do normal, que deixaram a paisagem mais parecida com o resultado de um terremoto ou tsunami japonês. Mas aí sim a tragédia foi agravada (e muito) pelo mau uso que o brasileiro faz da natureza, das áreas que deveriam ser de preservação permanente e são brutalmente invadidas por construções irregulares, que ocupam desde os pés dos morros até seus topos. Falta de consciência das pessoas aliada a um mercado imobiliário ganancioso e aproveitador, fora o desrespeito às Leis. Não é nem necessário dizer que, pelo Código Florestal, as áreas com declividades acima de 45º e também topos de morros são alguns dos casos considerados APPs (Áreas de Preservação Ambiental). Foram justamente em áreas assim que centenas de casas caíram e toneladas de terra vieram abaixo, numa tragédia repetida (em Santa Catarina ocorreu exatamente o mesmo em 2008) e prevista. É notório que mesmo as áreas com matas nativas que também caíram, tinham suas bases alteradas pela ação humana. Obviamente que a camada de terra da Serra do Mar, bastante fina e porosa, estava por demais encharcada com água. Mais uma prova de que terrenos assim não devem ser ocupados por moradias humanas. E agora no mês de março o litoral do Paraná sofreu com o mesmo tipo de tragédia, com inundações gigantescas, desabamentos, interrupção de estradas, etc.

E justamente proteções importantes como estas dentro do Código Florestal é que a bancada ruralista no Congresso Nacional, liderada pelo deputado Aldo Rebelo, querem eliminar. E as discussões intensificaram-se justamente durante as tragédias. Mesmo assim os deputados e os chamados "setores produtivos" de nossa economia não foram capazes de associar uma coisa a outra. Parece que vivemos em dois mundos diferentes (e de fato Brasilia vive à margem da realidade brasileira).

Embora não sejam cumpridas no Brasil, as Leis não são elaboradas por acaso. A questão no Brasil é que a Lei muitas vezes é letra morta por ausência de Políticas Públicas. Estas transcendem as Leis, que são apenas parte delas. Políticas envolvem ações preventivas, envolvimento da comunidade, comunicação, recursos humanos para atender a população, monitoramento de resultados, etc. No Brasil simplesmente cria-se a Lei e deixa-se ao "Deus dará". Com isso grande parte da população nem sabe que as Leis existem é para protegê-las, por isso não sabem cobrá-las dos parlamentares e estes fazem o que bem quiser com elas, revogam, anulam, etc.

Por isso não existe uma Política Ambiental efetiva no Brasil, embora tenhamos Leis muito bem elaboradas, das mais avançadas do mundo, dispersas em diversos Códigos (Florestal, de Recursos Hídricos, Resíduos Sólidos, etc.). Está tudo lá, mas a prova de que não se coloca em prática está aí.

E o pior é que após a ocorrência das tragédias, o máximo que se fez, como foi visto no Rio de Janeiro, foi isentar as pessoas de pagar contas como IPTU, água e luz por alguns meses. Esta atitude do governo do Rio de Janeiro e do governo federal beira o sarcástico, pois estas pessoas pagarão contas sobre imóveis inexistentes? Elas nem têm mais onde morar, precisariam de muito mais que "isenções temporárias". Vale ressaltar a rede de solidariedade que se formou em todo o Brasil, mostrando que a sociedade tem sim capacidade de mobilização, independente de governos. Então por quê não utilizar esta capacidade para defender nossas Leis e fazer com que sejam cumpridas?

Se for necessário modificar o Código Florestal seria com a finalidade de aprimorá-lo de forma a premiar os que preservam as florestas, fazendo a lei passar a ter, além dos mecanismos de comando e controle (que prevêem punição aos infratores), os mecanismos financeiros (de mercado), que incentivam a preservação através de isenções fiscais, possibilidade de venda de cotas florestais, créditos de carbono, etc. Hoje estes mecanismos existem de forma voluntária. Deveriam ser oficiais, fomentando uma "economia ecológica" de fato. Nossas florestas agradeceriam, os produtores rurais lucrariam com suas reservas (não considerando-as mais como "estorvos") e suas lavouras ainda se beneficiariam de terras mais férteis, clima melhor e menos agrotóxicos. Os próprios cientistas da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) disseram que as florestas valem muito mais em pé do que destruídas e que o Código Florestal deveria refletir estes serviços ambientais que elas prestam enquanto vivas. Mas esta não parece ser a mentalidade de nossas "classes produtivas", que ainda estão com mentalidade anterior ao século XIX, em que a ordem era desmatar, queimar, abandonar e ir plantar em outra área. Até não haverem mais florestas. Mas aí talvez nós nem consigamos mais viver por aqui...